Sabadinho

O azul das coisas simples
Uma paz no peito
Paz daquela que se diz
Com vogal esticada
Nem tem guerra
Nem rotina
Nem protocolo do clima
Não tem crise
Nem problema
Só uma brisa levinha
E o amarelo da sibipiruna
Florindo os cochilos
Pontuando os silêncios,
O cantar dos passarinhos
E dos meninos brincando
Lá longe,
Lá longe…

Sem remédio

As vezes minha alma dói tanto
Que eu não sei o que fazer
É como se uma pedra
Me esmagasse o peito
E me impedisse de respirar
Uma dor que me engasga
Que embrulha o estômago
É tão real que penso
Ser possível arrancar
Com mão
Com lágrima
Com um corte
Profundo e fatal
Eu não quero essa dor
Não posso acolher
E Não posso deixá-la
Não é minha
Mas parece parte de mim
Eu quero gritar
Exorcizar
Mas ela enraiza
Mãos, pés, cordas vocais
E me engole
E entorpece
As vezes minha alma
Dói tanto
Que eu só quero
Deixar de sentir.

Às vezes eu vomito palavras
E isso me anestesia.
É um remédio cada vez menos eficaz.

Se ou quando

Eu escrevo para que saibas 
um dia se
ou quando
eu não puder mais
resistir
que eu tive também
coisas bonitas dentro de mim

Que na dor eu vi
Beleza
Que fiz de lágrima
Verso

Assim, doído, magoado
Sem métrica
Sem talento
Mas poesia

Que quando a alma
Se rasgava em
Melancolia
Eu era música

E flutuava num futuro
De sonhar
De sonhar
De sonhar

Eu quero que saibas
Se
Ou quando
Eu não puder mais
Resistir
Que eu te espero sorriso
E que a canção mais bonita
Que escuto no vento
Diz de harmonia e paz
Construído em Adeus

“Que o amor foi tanto…”

Outras bodas

Não há beleza na poesia
Nenhuma beleza no verso
Rasgado de solidão
Não há outra, não mais
Só o tempo
Roendo feito traça
Os vestidos amarelados
Os vestidos perdidos
Os vestidos sonhados
Os vestidos que nunca couberam
No peito calejado

Histórias que se repetem
Num ciclo ancestral
De lágrima que finge que é força
E de tanto fingir, se crê forte
Maldição sem sagrado
Sem erva de cura
No amargo que não finda
No abraço que não vem.

Virá libertação
Quando escolhermos
parar de esperar.

Segundo domingo

Eu queria ter uma foto do meu pai. Uma foto com sua mão em minha cabeça. Ver seu olhar sereno, a expressão tranquila de me ter sob seu cuidado.

Eu queria ter um áudio com a voz do meu pai. Sua voz bonita, falando qualquer coisa, porque cada palavra era paz, resiliência, esperança e sossego.

Eu queria um vídeo do meu pai. Vê-lo sorrindo, daquele jeito tímido, ou naquela farra de cócega, quando todo o corpo se contorcia em gargalhada.

Eu queria que a minha memória não me traísse, que eu pudesse guardar cada lembrança em um lugar que não se perdesse jamais, que não virasse névoa com o por do sol.

Eu queria abraçar meu pai de novo, por alguns segundos. Dizer obrigada, desculpa e eu te amo. Pelo menos mais uma vez.

de sal

Me plantei ali,

naquela semente

que não existe e

que ninguém jamais verá

No teu abraço abstrato,

chão fecundo.

Terra vermelha, poeira, zumbido

Me reguei em lágrima

sem suor, nem saliva

Choro solitário

Que atravessa a madrugada.

O mundo era tão grande

Tão grande as dores

E a minha vergonha

De só sentir o meu e só.

De me olhar me movendo

No tempo

Como se não fosse eu.

Me cobri de nada

Do branco vazio

que também é breu

Me plantei semente

No vácuo.

Sem sol.

Sem ar.

Só águas de sal.

Carpa

A intuição daquela coisa — aquela sabe? —
Que ia despertar uma vontade absurda de viver.
Tateando. Sonhando. Pensando.
Será que é arte? Será que é fuga? Será que move?
Pesquiso símbolo no Google
Buscador me deu grupo. Pacificação.
boa sorte, virilidade, sabedoria. Resistência
sucesso, vida longa e perseverança.
E eu, num caos passivo
Escrevendo frases sem sentido
E dizendo que é um poema. Pfff
Logar nas redes para voltar solidão
E seguir amargando intuição.
A intuição daquela coisa, sabe?
Aquela, que ia despertar, enfim,
Uma vontade absurda de viver.

Sem título

Um coração que vai explodir
Em palavras toscas presas na garganta
Numa compreensão que não entende
Num aceitar que se revolta
Não me importa se você
Não quero saber quando você
Não me interessa o que você
Porque quando você é, está, quer
Eu não sou nada mais
Que palavra muda
Esperando para aceitar
Esperando para dizer
Tudo bem.
Eu entendo.
Eu espero.
Um coração vai explodir
E muitas palavras flutuarão
Sem destino pelo espaço.
Elas não estarão mais
Guardadas dentro de mim!

05/02/2013

Como antes

Aparentemente o mundo

Continua exatamente igual

Somente eu mudei

A terra se aproxima

Outra vez

De onde nunca esteve

E meus espelhos

Seguem sem olhos

Tudo absolutamente igual

Entretanto, eu mudei

O banho, a cama, o suco

Lembranças de imaturidade

E gentileza

O olhar terno que tenho

(Ainda ou afinal)

E que me surpreende

Num mundo em ritmo lento

Vertiginosamente lento

Tudo, tudo igual

Não me adapto, porque

eu mudei

Aqui ainda dói

E eu nem sei quanto

O sol já vem de novo

Mas por enquanto

As horas são noite

Na porta fechada

Tudo, tudo igual

Somente eu mudei.